O pós-apocalíptico é assunto atual.
Bacurau vai muito além de passar uma mensagem antifascista e crítica ao Imperialismo genocida Norte-americano. Ele mostra um exemplo prático da Autogestão. Não é preciso se identificar como anarquista para colocar em prática seus princípios, e várias facetas da ideologia estão presentes ali.
Para começar, o conceito mais escancaradamente anarquista do filme é a crítica ao sistema eleitoral e a zombaria de políticos. Aqui se vê um povo que não cai na armadilha da maquininha, não se deslumbra com migalhas, e não se ilude com promessas.
As migalhas que o político traz, livro, comida e remédio, não são desperdiçados. Porém, a mercadoria é problematizada publicamente, e cada indivíduo é livre para decidir por si mesmo o que fazer com essa informação. O que nos traz ao princípio libertário. Não existe uma instituição que exerce autoridade sobre o que é ou não é permitido na comunidade, ou que faz decisões pelos indivíduos.
Quem está na posição de ter sua voz amplificada não necessariamente tem uma posição de autoridade. Há protagonismo por conta do roteiro cinematográfico, mas a horizontalidade é visível na organização das funções no povoado. Cada um fala de acordo com a função que exerce, e todas elas são valiosas e respeitadas- da médica à prostituta. Mesmo os homens que acabam sendo figuras públicas por estarem presentes na mídia, não fazem nada mais do que exercer funções de acordo com suas perícias. Eles não se atrevem a usar suas posições como personalidades para mandar nos outros como o político mandou no funcionário: “Filma!”.
Não se manda no outro e não há Polícia. Há uma rede de segurança que funciona como uma função qualquer. Por não ser institucionalizado, a opressão burocrática e física não existe. A função é baseada em manter a segurança da comunidade da qual eles e elas fazem parte, assegurando seus próprios interesses, e não os de outros que estão dentro ou fora da instituição.
Cuidar de sua própria segurança significa se armar. A população tem e sabe usar armamento, e isso é essencial para a autonomia. A violência se combate com violência, infelizmente. E é fácil para muitos esquecerem qual é a fonte da violência contra a qual reagimos.
Um grande obstáculo que temos para praticar a autogestão e alcançar autonomia é o acesso à meios de comunicação. Eletricidade, sinal, Internet e plataformas de informação (como Google Maps) são hoje essenciais para nossa sobrevivência mas ainda não estão sob nosso controle. Por isso, foi esse o calcanhar de Aquiles da comunidade.
Temos muito a aprender com esse filme, e acredito que no futuro diremos para as próximas gerações que lembramos quando ele saiu. Que Bacurau seja uma inspiração para o movimento de resistência. Não somos brancos, ocidentais, Norte-americanos. Somos latinos e latinas, pretos e pretas, indígenas e além, mas sujeitos a eles espero que não por muito mais.
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texto: Mirna Wabi-Sabi