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SOBRE A CONJUNTURA ATUAL

Esse é o cenário de agora. Todos com medo da próxima movimentação de Bolsonaro, enquanto o golpe de fato já foi realizado há tempos, os militares com sua ótima relação com o STF e os empresários, mexendo os pauzinhos.

O golpe preventivo segue seu curso nas últimas jogadas dos militares, que estão saindo em retirada do governo Bolsonaro. Com isso, podem se afastar e serem os grandes salvadores da crise que eles mesmos arquitetaram. A ideia é perfeita: a mídia já acusando o Bolsonaro por seus intuitos ditatoriais, enquanto pintam esses seres da alta cúpula como os democráticos, os que são capazes de proteger a nação de um lunático, e ainda guardam em seus corações a democracia brasileira.
A jogada aqui não é que Bolsonaro não tenha de fato esses desejos, ele tem. Porém, mais interessante que isso é a maneira que Bolsonaro está sendo usado para construir uma imagem de vilão contra os nossos heróis fardados.
Das duas uma, figuras do decadente estabelecimento político, como Ciro Gomes, já afirmou em um de seus tweets que é muito mais fácil Bolsonaro receber um impeachment do que arrastar as Forças Armadas para fazer qualquer coisa. É uma opção. O outro caso é a inflamação dos discursos antidemocráticos de Bolsonaro e articulações para realizar seus pedidos, como o Estado de Sítio que estava propondo, irem para frente.
Nos dois casos, a tática de uma parcela dos fardados foi a de desvincular sua imagem desse governo enquanto havia tempo. Teríamos, então, uma tentativa de golpe militar em que as próprias Forças Armadas nos salvariam desse golpe, ou o cenário de impeachment com os militares como uma oposição racional.
Encabeçando essa linha, temos Edson Leal Pujol, ex-comandante do Exército, que é tido como um dos principais representantes na defesa das Forças Armadas como uma instituição que não serviria governos e nem ideologias, e sim o Estado. Esse canto de sereia está sendo perfeitamente abraçado pela mídia e setores importantes da sociedade. “A confiança nas Forças Armadas é inversamente proporcional à confiança em Bolsonaro”, disse Felipe Santa Cruz, o presidente da OAB, em seus últimos tweets.
Além do xadrez feito pelos militares, em que estão transformando uma coisa em seu oposto, os empresários também se movimentaram na tão falada reunião em São Paulo, juntamente com os políticos Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, em que a burguesia financeira demandou a exoneração de Ernesto Araújo, pelo deterioramento das relações do Brasil com a China, e de Ricardo Sales, já que a política ambiental agora irá comandar boa parte da política externa dos Estados Unidos, e assim as relações serão ainda mais minadas com a potência mundial.
Para resolver a situação criada, com a perda de credibilidade de Bolsonaro e Guedes com a burguesia financeira e o imperialismo, setores da ala militar falam de uma terceira via. Figuras como o general Santos Cruz, que agora se declara em oposição total a Bolsonaro, aposta em Moro para formar chapa em 2022, ou talvez até ele próprio.
Fora tudo isso, o caos instaurado no Brasil por causa da Covid-19 tornou-se um momento político perfeito para uma pequena burguesia e uma burguesia nacional frouxas ajoelharem na frente dos Estados Unidos e das Nações Unidas pedindo interferência. Podemos ver isso na “carta à humanidade”, assinada por ex-ministros, celebridades, políticos e intelectuais.
Essa proposta tem sido acatada por políticos do partido democrata dos Estados Unidos, como a deputada Pam Keith, em sua publicação no dia 26 de março, em que se mostrou preocupadíssima com a situação da pandemia no Brasil e entendeu que a solução seria os Estados Unidos tomarem conta da resolução da crise. Depois disso, vemos o vergonhoso pedido de influenciadores como Felipe Neto, em toda a sua covardia, chorando e implorando por uma gestão americana no Brasil.
A questão da intervenção e decadência das relações já iria ser uma questão por conta de política ambiental dos EUA, saindo ontem a notícia que Biden espera ver o fim do desmatamento no Brasil até 2030. Assim, esse novo imperialismo verde substitui o conto de levar a democracia para os países do mundo.
Esse é o cenário de agora. Todos com medo da próxima movimentação de Bolsonaro, enquanto o golpe de fato já foi realizado há tempos, os militares com sua ótima relação com o STF e os empresários, mexendo os pauzinhos. Ainda é, no entanto, cedo para afirmar qual será o caminho seguido, se será impeachment, a busca por uma terceira via em 2022, a salvação de um golpe, e o quão aberta a participação do imperialismo vai ser.
A esquerda liberal, que só se concentra em tirar o Bolsonaro, não tem a percepção do que é o Estado, ainda acreditando na democracia burguesa e nas instituições. Acham que a solução é a demissão de Bolsonaro, como se isso fosse restaurar o mundinho de concessões e oportunismo que eles antes conheciam, e assim poderão dormir em paz. Bolsonaro é um genocida, mas a luta para o impeachment, colocando Mourão como opção viável e moderada é de uma cegueira tremenda, ou de pura indiferença com qualquer ideal de mudança concreto.
Ainda estão se escondendo por trás de princípios de bom mocismo, deixando a luta de classes no segundo plano, com um idealismo vazio nas “instituições democráticas”, que estão cada vez mais desacreditadas pela população. Essa “esquerda”, no melhor dos casos, esquece que está em um contexto de golpe de Estado.
O que podemos afirmar é que o capital financeiro e parcela dos militares bateram em retirada, demarcando uma linha de oposição falsa contra ideias golpistas, e que alguma outra via que não seja o PT e Bolsonaro irá ser apresentada por esses setores.

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Texto: Ana Botner
Ilustração: Janayna Araujo e Rafael Almeida