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Mulheres e Ficção

Mulheres não podem ficar presas ou serem apenas ouvidas quando falam sobre a mulher, enquanto os homens têm completa liberdade para explorar qualquer assunto e serem tratados com seriedade.

O que as mulheres escrevem? Esse assunto foi explorado pela célebre escritora Virginia Woolf (1882-1941) em seu pequeno ensaio “Mulheres e ficção”. Ela indaga que por mais que as mulheres tenham escrito no século dezenove quase o mesmo que os homens, em termos de quantidade, tendo algumas delas escritos considerados hoje clássicos da literatura, a escrita das mulheres sempre aparece na forma de ficção. Ela fala especificamente de Emily Bronte, Charllote Bronte, Jane Austen e George Eliot e questiona que, mesmo que elas todas possam ser figuras completamente distintas umas das outras, ‘’todas foram treinadas para a mesma profissão; todas, ao escrever, escreveram romances’’. (página 12, edição da penguin). A sua crítica no ensaio ao porquê dessas mulheres, mesmo que brilhantes e talentosas, escreveram romances e não peças de teatro ou poesias pode ser transportada para os dias de hoje.

Claro que, hoje, temos inúmeras poetas e dramaturgas. Então vamos para outro campo, a literatura prevalece sendo a modalidade de escrita mais escolhida pelas mulheres. A quantidade de mulheres filósofas, antropólogas, sociólogas e teóricas políticas que podemos afirmar que marcaram qualquer um desses campos é mínima. Podemos citar a Hannah Arendt, Simone de Beauvoir, Rosa Luxemburgo, Angela Davis, Margaret Mead e, mesmo que eu discorde de tudo que ela diga, Ayn Rand, como intelectuais originais que fizeram uma verdadeira diferença em seu campo de conhecimento. O número é mínimo.

Indo um pouco mais além, mesmo com esse número pequeno, as mulheres, mesmo que tenham escritos sobre muitos outros assuntos, como a Simone de Beauvoir e a Margaret Mead tornaram-se notórias exatamente por falarem sobre a questão de gênero, sobre a mulher. Não que não seja importante tocar nesse assunto, é mais que essencial, porém as mulheres não podem ficar presas ou serem apenas ouvidas quando falam sobre a mulher, enquanto os homens têm completa liberdade para explorar qualquer assunto e serem tratados com seriedade.

Já passamos da era, como a própria Virginia Woolf coloca em seu texto, em que mulheres escrevem puramente sobre si e suas relações interpessoais e sentimentais, elas agora estão inseridas no campo social e político, e seus escritos tocam nesses assuntos assim como o dos homens. A questão é exatamente que as mazelas sociais mais apontadas pelas mulheres são as sobre questões de gênero, sobre a vida de outras mulheres e as dificuldades pelas quais apenas elas passam. Evidente que, é dever das mulheres escrever e pontuar essas questões sociais e lutar pelos seus direitos, mas não devemos também deixar de lado vários outros temas que são ocupados majoritariamente por homens. As mulheres devem estar falando sobre mulheres, mas, ao mesmo tempo, também sobre a política, filosofia, antropologia e muitos outros campos de conhecimento que não destacam a questão de gênero e sendo destacadas nessas áreas. Mulheres falando sobre ideologias, política externa, questões existenciais da humanidade, guerras, classe, entre muitos outros temas, e sendo reconhecidas como marcos nesses assuntos por criar conceitos e trazer novas ideias, é o que devemos almejar.

Neste pequeno ensaio de Virgina, tem uma passagem onde ela diz “é provável que, quer na vida, quer na arte, os valores de uma mulher não sejam os mesmos que o dos homens”. Ou seja, o que pode ser considerado banal para um homem, pode ser visto como essencial para uma mulher no que diz respeito a qualquer questão. O mundo necessita das mulheres impondo suas opiniões críticas sobre qualquer questão. Colocando a sua visão sobre os acontecimentos de maneira assertiva. Talvez isso seja a chave para uma virada que todos desejamos que aconteça no mundo atual. Para todos aqueles que desejam a mudança radical do sistema em várias áreas. O ponto de vista teórico e crítico sendo exposto de forma mais evidente, quantitativa e qualitativamente, pode ser o começo da solução para algumas das questões chave que enfrentamos hoje.

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texto: Ana Botner